O colapso da economia ecológica? ou: Quando os cientistas mentem.
A necessidade de entender corretamente os problemas ambientais sempre foi posta como um dos pilares da economia ecológica em contraste à neoclássica.
Recentemente foi realizado um evento na Unicamp sobre Fórum Capitalismo e Meio Ambiente, Crescimento Zero e Desenvolvimento Sustentável. no qual acadêmicos discutiram as inter-relações entre ambos e possíveis soluções para os problemas atuais.
Lamentavelmente vemos em uma palestra o conhecido Prof. José Eli da Veiga (https://www.youtube.com/watch?v=06TGj0G-jto) argumentando sobre dois pontos importantes que merecem uma análise mais próxima: Primeiro aponta que se ultrapassados supostos limites impostos pela natureza não teremos um colapso. A base de tal argumentação é a proposição de Rockström et al no artigo “A safe operating space for humanity” publicado na Nature em 2009 (em anexo) ( https://www.nature.com/nature/journal/v461/n7263/full/461472a.html) , no qual o mesmo e sua equipe sustentam a proposta de trabalhar com o termo “fronteiras” e não “limites”, o que conforme Eli da Veiga aponta, daria maior flexibilidade dado que fronteiras não tem a característica absoluta dos limites.
Ao apontar que Rockström verificou que já ultrapassamos algumas fronteiras, sem a ocorrência do esperado colapso, argumenta que lidamos com questão de risco, ameaça e incerteza (probabilidade), e não certeza de colapso. Argumenta que o risco de um colapso por uma guerra mundial é maior que o risco de um colapso pelos problemas ambientais, esquecendo que existem mecanismos políticos globais de controle para evitar o primeiro mas não o segundo, tornando o risco nuclear mais incerto que o ambiental.
Mas que disse Rockström?
Segundo o artigo de Rockström: ".. we propose a framework based on ‘planetary boundaries’. These boundaries define the safe operating space for humanity with respect to the Earth system and are associated with the planet’s biophysical subsystems or processes. Although Earth’s complex systems sometimes respond smoothly to changing pressures, it seems that this will prove to be the exception rather than the rule. Many subsystems of Earth react in a nonlinear, often abrupt, way, and are particularly sensitive around threshold levels of certain key variables. If these thresholds are crossed, then important subsystems, such as a monsoon system, could shift into a new state, often with deleterious or potentially even disastrous consequences for humans."
Sobre a "plasticidade" das fronteiras Rockström diz: "Although the planetary boundaries are described in terms of individual quantities and separate processes, the boundaries are tightly coupled. We do not have the luxury of concentrating our efforts on any one of them in isolation from the others. If one boundary is transgressed, then other boundaries are also under serious risk. For instance, significant land-use changes in the Amazon could influence water resources as far away as Tibet. The climate-change boundary depends on staying on the safe side of the freshwater, land, aerosol, nitrogen–phosphorus, ocean and stratospheric boundaries. Transgressing the nitrogen–phosphorus boundary can erode the resilience of some marine ecosystems, potentially reducing their capacity to absorb CO2 and thus affecting the climate boundary."
"The boundaries we propose represent a new approach to defining biophysical preconditions for human development. For the first time, we are trying to quantify the safe limits outside of which the Earth system cannot continue to function in a stable, Holocene-like state."
Ou seja, não é possível ultrapassar uma fronteira sem prejudicar outra e é necessário “Quantificar LIMITES seguros FORA DOS QUAIS o sistema Terra não pode continuar funcionando".
Em seguida, Eli da Veiga contrapõe o texto “A Blueprint for Survival” (publicado como edição especial da revista 1972), segundo o qual os países não desenvolvidos não deveriam ter a autonomia para se desenvolver, mas esquece de explicitar que a proposta to texto é evitar a expansão do modelo de desenvolvimento tradicional. Segundo os autores: “An examination of the relevant information available has impressed upon us the extreme gravity of the global situation today. For, if current trends are allowed to persist, the breakdown of society and the irreversible disruption of the life-support systems on this planet, possibly by the end of the century, certainly within the lifetimes of our children, are inevitable... Such a movement cannot hope to succeed unless it has previously formulated a new philosophy of life, whose goals can be achieved without destroying the environment, and a precise and comprehensive programme for bringing about the sort of society in which it can be implemented.” (http://www.edwardgoldsmith.org/books/a-blueprint-for-survival/). Esquece também que a base para “A Blueprint for Survival” foi a reunião do Clube de Roma, cujo relatório do mesmo ano “Limites do Crescimento” apontava para a necessidade de obervar os limites naturais para o crescimento econômico em seu, então, controverso modelo do desenvolvimento humano, com previsões catastróficas caso mantivéssemos o rumo que seguíamos. Novamente o professor esquece de comentar que o controverso modelo, conhecido como World3, foi de fato calibrado e validado: “The World3 model runs are valid, and approximately correct when compared to observations 1972-2015 (http://www.wrforum.org/wp-content/uploads/2015/09/ Limits-to-growth.pdf) “By calibrating World3-03 with updated time series (1995–2012), we show how the structure of the model can still provide a reliable description of some of the macro behaviours of today’s global system.” (http://www.mdpi.com/2071-1050/7/8/9864/pdf), “Turner’s conclusions are by definition a “no-win” outcome for the LTG modelers, since 35 years of history roughly following the “Standard Run” scenario proves a) that the model was reasonably accurate but b) that no substantial action was taken to alter mankind’s course. A case of “I told you so” - technical success but political (and environmental) failure!”
Resta a pergunta, tais lapsos indicam que terá a economia ecológica, ao menos no Brasil, finalmente cedido aos interesses maiores e abandonado a análise crítica das consequências do processo econômico tradicional?
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Eu tenho a impressão que as argumentações de Rockstrom e Eli da Veiga estão consonantes.
ReplyDeleteA economia ecológica ( e a neoclássica ) são correntes de pensamento e análise. O que está acontecendo no brasil, ou em qualquer outra parte, pode ser entendido ou explicado ou planejado em função de uma ou de outra, ou de nenhuma delas.
Se com sua pergunta voce sugere que o planejamento e a dinâmica economica brasileiras hegemonicas operam sob os pressupostos da economia neoclássica, concordo. Acho que desde a invasão européia é assim.
Na verdade Eli distorceu completamente o texto de Rockstrom para adequar a uma visão mais tradicional.
DeleteMeu ponto é justamente que a economia ecológica,no Brasil, ou pelo menos parte deles, estão derivando para a neoclássica por razões que ainda não determinei.
No mesmo evento temos a apresentação do Ademar também amenizando a questão dos limites mas, mais crítico, apontando uma necessidade de soluções tecnocentricas para o problema.
José Eli da Veiga é um economista tradicional travestido de ecológico, porém defensor de crescimento do PIB e de energia nuclear. Como Júlio mostrou no texto cita autores sob a falsa pretensão de erudição apenas para distorcer o que foi dito para adaptar o discurso ao que certos públicos "gostariam de ouvir". Anti-cientifico. Sem falar que pega carona em ideias antigas e arraigadas já em relação ao problema atual sem dar o devido crédito ou mesmo de entender o que realmente significam como crítica ao status quo que está levando toda a vida na Terra ao seu fim.
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