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A Sustentabilidade Importada

Worldpress.com / Foodtank.com
Hugo Penteado
Julio F. Campos

Qual o segredo por trás dos países mais sustentáveis do mundo dentro do atual cenário de interações globais? Este artigo discute as formas de relacionamento que fundamentam esta sustentabilidade.

A lista dos 10 países mais sustentáveis do planeta varia dependendo da fonte pesquisada, mas é basicamente formada por países europeus, com os países nórdicos usualmente ocupando o topo da lista, tradicionalmente encabeçada pela Suécia.

Variações dos países que compõe a lista incluem também Canadá, Austrália e Nova Zelândia.

Recentemente o estudo “A good life for all within planetary boundaries”  da Universidade de Leeds, analisando nossa capacidade de viver,com qualidade de vida adequada, dentro dos limites definidos pelo planeta, com base nos modelos atuais de crescimento, apontou que, dos 150 países estudados, apenas o Vietnam estaria em situação próxima de atingir os resultados ideais, com níveis de consumo de recursos dentro da capacidade suporte do planeta, embora necessite ainda desenvolver suas questões sociais. (O leitor pode analisar o status de cada um destes países aqui)
O estudo conclui que a busca pelo desenvolvimento humano de forma universal proposta pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, sem minar a capacidade planetária, somente é possível se estes objetivos se desviarem das propostas de crescimento.
Comparação entre indicadores sociais e ambientais do Vietnam e Suécia. (https://goodlife.leeds.ac.uk/countries/#Vietnam)

Rockström et al, em seu artigo seminal “A safe operating space for humanity”, ainda em 2009, seis anos antes da definição dos ODSs,  apontou que ultrapassamos, na época, três dos principais limites do planeta.

Estimativa da situação dos limites planetários em 2009. Em vermelho os já ultrapassados (Rockström et al, 2009)


Outro estudo recente, analisando as fontes de emissões no consumo de recursos da Áustria aponta que sua maioria se encontra fora de suas fronteiras, incluindo fora das fronteiras europeias. Isto significa que a maioria de suas emissões derivadas do consumo de recursos naturais são externas ao país.

Uma análise da estrutura econômica dos países listados como sustentáveis revela duas características comuns, um alto nível de desenvolvimento e alto nível de dependência de produtos externos.
Existe uma contradição entre os países listados como sustentáveis e aqueles que realmente são.
Quando analisamos a fonte destes recursos observamos países em desenvolvimento ou pobres cuja principal base para suas economias é a exportação de bens aos países desenvolvidos, os quais ficam com os bônus do acesso a recursos baratos enquanto que aqueles ficam com o ônus da degradação ambiental inerente à exploração.

Como resultado temos nestes países a produção de um bem que não precisam, consumindo seus ecossistemas e colocando em risco sua segurança hídrica e alimentar. Este modelo econômico de exportação impõe um custo ecológico e ambiental e social astronômico que não entra na conta paga pelos importadores porque no nosso sistema de preços geral e no comércio global esses custos são considerados nulos (por isso o negócio é tão lucrativo); em outras palavras, o custo de transformar ecossistemas em monoculturas e pasto é zero em nosso SISTEMA DE VALORES e os países importadores não pagam um centavo dessa conta para felicidade da economia.

Como consequência, temos que se os ditos países sustentáveis, ou qualquer país desenvolvido, somente pudessem consumir a produção realizada apenas dentro do seu próprio território e com seus próprios ecossistemas já teriam entrado em colapso ambiental há décadas.
Essa é a grande proeza do COMÉRCIO GLOBAL, permitir aos países evitarem seu próprio colapso ao exportá-lo para o resto do planeta e a CUSTO ZERO. 
O resultado dessa proeza é que hoje temos uma reprodução em ESCALA GLOBAL deste modelo de desenvolvimento (invejado por muitos) suicida dos países mais ricos, que se imaginam supostamente livres de qualquer problema ambiental graças ao COMÉRCIO GLOBAL, e acreditamos que conseguiremos, quando atingir o limite do GLOBO TERRESTRE, fazer o mesmo exportando nossos problemas para outros planetas, quando a verdade a reprodução daquele modelo apenas nos levará ao colapso.

Colapso cujos sinais não apenas foram preditos, mas posteriormente verificados, pelo modelo dos "Limites do crescimento" ainda nos anos 70.


Revisão dos resultados do modelo do “Limites do Crescimento”. Linha contínua clara - dados reais usados no modelo original; Linha pontilhada – previsão feita pelo modelo; Linha contínua escura – sobreposição dos dados históricos com os previstos até 2012 (https://us.resiliencesystem.org/looking-back-limits-growth)
Não é por outra razão que o COLAPSO que falamos agora não é mais local, mas GLOBAL e PLANETÁRIO.
Desta forma, resulta que o modelo de sustentabilidade apresentado pelos países europeus depende exclusivamente da cínica exportação de sua insustentabilidade para países que, sobretudo por corrupção política / intelectual de seus líderes, são mantidos na mera condição de celeiros globais, não sendo permitido, pelos modelos impostos, buscar suas próprias soluções de desenvolvimento social e econômico.

Com os olhos de esperança buscando nas soluções nórdicas a resposta para nossos problemas, o mito do desenvolvimento formatado na economia tradicional acoberta o fato que ao menos um país tem grande parte das respostas que necessitamos para nos manter nos limites impostos pelo planeta.

Mas no mundo do século da informação, do digital, do 4.0, um pequeno país considerado atrasado o sudeste asiático não tem motivos para ser usado como exemplo. Melhor espelhar o desenvolvimento daqueles que jamais teriam atingido seu invejável status atual sem a irrestrita exploração de países condenados à desigualdade social e econômica.

Enquanto o superávit ambiental dos últimos continuar a sustentar e abater o déficit daqueles sabemos que, afinal como os países líderes da sustentabilidade ensinam, para qualquer problema haverá uma solução tecnologia virando a esquina.

Os desenvolvimentistas da economia tradicional podem então argumentar, alheios à eterna repetição de seu mesmo erro: vamos olhar o que o Vietnam fez e copiar. Nada poderia nos levar para mais longe das necessárias soluções, as quais são inerentes à cada país e o que levou aquele pequeno país a estar apto à viver dentro dos limites planetários é aplicável exclusivamente à ele, e portanto suas propostas não podem ser replicadas por outros.

Entre enfrentar a realidade do problema ou viver na crença em uma possível e eventual solução tecnológica, é uma decisão que não cabe aos governos, corporações ou sociedade, mas às pessoas hoje, indiscriminadamente, pois seus filhos serão, para bem ou para mal,  as vítimas finais de quaisquer decisões por elas tomadas.

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